Uma malformação que acontece no início da gestação, entre a quarta e a décima segunda semana, a fissura labiopalatina pode acometer os lábios superiores e o palato (céu da boca). No Brasil, dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que uma a cada 650 crianças nasce com esse defeito congênito, que tem diagnóstico precoce por ultrassom no final do primeiro trimestre da gestação. No entanto, segundo os especialistas, o início do tratamento tem previsão apenas após o nascimento, por volta do terceiro mês de vida. A cirurgiã dentista, pesquisadora e geneticista Daniela Bueno, afirma que o procedimento tradicional é delicado e as intervenções cirúrgicas são realizadas em três fases para que a fissura labiopalatina seja fechada. Uma delas, que consiste na retirada de uma parte do osso da bacia, seria evitada com o uso da terapia celular com célula-tronco mesenquimal da polpa do dente de leite.
A pesquisadora ainda explica que as células-tronco mesenquimais do dente de leite foram escolhidas para o seu estudo clínico no tratamento da fissura labiopalatina porque são capazes de dar origem a outras iguais a elas, com capacidade regenerativa para fazer osso, músculo, cartilagem e gordura. “Essas células podem se especializar, com qualidade, em qualquer outra célula de tecidos sólidos do corpo humano. Além disso, toda criança entre 6 e 12 anos terá a substituição natural dos dentes de leite pelos permanentes. É no período também que os enxertos ósseos secundários são realizados nos pacientes, entre os 8 e 12 anos de idade. Desta forma, o dente de leite é uma “fonte não invasiva” de células-tronco mesenquimais para ser utilizada, com chances de rejeição praticamente nulas, explica”. Ela ainda conta que a sua pesquisa e o desenvolvimento do estudo clínico trazem benefícios para as crianças submetidas ao procedimento.
“O padrão ouro para promover o fechamento do osso alveolar dos portadores de fissura labiopalatina é a utilização do osso da crista ilíaca (bacia). Ele é removido e utilizado para fechar o osso alveolar do paciente (procedimento que gera morbidade e dor na região doadora). A criança tem que ficar hospitalizada por mais um dia para acompanhar a morbidade da região doadora. Já para realizar o tratamento com as células-tronco, quando a criança tem um dente decíduo e esfoliação (com 1/3 de raiz), entre 6 e 8 anos de idade, o dente é extraído em consultório odontológico, enviado por transportadores especializados para as empresas de criopreservação de células-tronco de polpa de dentes decíduos", explica Daniela.
Em Campinas, interior de São Paulo, está situado o centro pioneiro na técnica de isolamento, expansão e armazenamento de células-tronco do dente, tecido adiposo e do céu da boca (periósteo do palato) do país, a R-Crio. "Sou consultora científica da R-Crio, é para lá que os meus pacientes, desde a finalização do projeto PROADI-SUS de bioengenharia de tecidos, enviam seus dentinhos. Lá, as células-tronco mesenquimais são isoladas e caracterizadas. Depois, são armazenadas. Todos os processos seguem as boas práticas de manipulação e as legislações e regulamentações vigentes em nosso país. No momento da realização do enxerto, após a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e dos comitês de ética, estas células são descongeladas na R-Crio e enviadas ao centro cirúrgico sob responsabilidade do médico que executará a cirurgia de enxerto alveolar. Essa forma de tratamento reduz a morbidade e a dor na criança, além da redução de custos para a realização dos procedimentos, finaliza Daniela.